O aborto não é, como dizem, simplesmente um assassinato.
É um roubo...
Nem pode haver roubo maior.
Porque ao malogrado nascituro rouba-se este mundo, o céu, as
estrelas, o universo, tudo.
O aborto é o roubo infinito"
O aborto não é, como dizem, simplesmente um assassinato.
É um roubo...
Nem pode haver roubo maior.
Porque ao malogrado nascituro rouba-se este mundo, o céu, as
estrelas, o universo, tudo.
O aborto é o roubo infinito"
Não há no mundo quem amantes visse
que se quisessem, como nos queremos.
Um dia, uma questiúncula tivemos,
por um simples capricho, uma tolice.
— "Acabemos com isto!" — ela me disse,
e eu respondi-lhe assim: — "Pois acabemos!"
E fiz o que se faz em tais extremos:
tomei do meu chapéu com fanfarrice;
e, tendo um gesto de desdém profundo,
saí, cantarolando... (Está bem visto
que a forma, aí, contrafazia o fundo).
Escreveu-me... Voltei. Nem Deus, nem Cristo,
nem minha mãe, volvendo agora ao mundo,
eram capazes de "acabar com isto"!
[ARTHUR AZEVEDO]
Quando partimos, no verdor dos anos,
da vida pela estrada florescente,
as esperanças vão conosco à frente,
e vão ficando atrás os desenganos.
Rindo e cantando, céleres e ufanos,
vamos marchando descuidosamente...
Eis que chega a velhice, de repente,
desfazendo ilusões, matando enganos.
Então, nós enxergamos, claramente,
como a existência é rápida e falaz,
e vemos que sucede exatamente
o contrário dos tempos de rapaz:
— Os desenganos vão conosco à frente
e as esperanças vão ficando atrás
[ANTÓNIO TOMÁS]
Quando depões sobre o teu Cristo amado,
— esse Cristo que pende de teu peito,
ungido de ternura e de respeito —
um beijo de teu lábio imaculado,
eu, sacrílego, sinto-me levado
— ou seja por inveja, ou por despeito —
a arrebatar o Cristo de teu peito
e em teu peito morrer crucificado.
Mas, quando vejo, do teu lábio crente,
cair sobre o Jesus a prece ardente,
talvez por nosso amor, talvez por mim,
ardo na chama intensa dos desejos
de, arrependido, sufocar meus beijos
nesse teu alvo Cristo de Marfim.
[ANTERO BLOEM]
Em solitária, plácida cegonha.
imersa num cismar ignoto e vago,
num fim de ocaso, à beira azul de um lago,
sem tristeza, quem há que os olhos ponha?
Vendo-a, Senhora, vossa mente sonha.
Talvez que o conde de um palácio mago
loura fada perversa, em tredo afago,
mudou nessa pernalta erma e tristonha.
Mas eu que, em prol da Luz, do pétreo e denso
véu do Ser ou Não-Ser, tento a escalada,
qual morosa, tenaz, paciente lesma,
ao vê-la assim, mirar-se na água, penso
ver a Dúvida humana debruçada
sobre a angústia infinita de si mesma
[ANÍBAL TEÓFILO]
Toda pena de amor, por mais que doa,
no próprio amor encontra recompensa.
As lágrimas que causa a indiferença,
seca-as depressa uma palavra boa.
A mão que fere, o ferro que agrilhoa,
obstáculos não são que Amor não vença.
Amor transforma em luz a treva densa;
por um sorriso Amor tudo perdoa.
Ai de quem muito amar, não sendo amado,
e, depois de sofrer tanta amargura,
pela mão que o feriu não for curado...
Noutra parte há de, em vão, buscar ventura:
— fica-lhe o coração despedaçado,
que o mal de Amor só nesse Amor tem cura.
[ANA AMÉLIA]
Tudo isto há de passar, de certo, muito em breve...
Branca névoa sutil ir-se-á quando o sol nasça;
branco sonho de amor, passará, como passa
pelas ondas em fúria uma garça de neve.
Passará dentro em pouco, imitando a fumaça
que se evola e se esvai nas curvas que descreve.
Fumaça de ilusão, força é que o vento a leve,
força é que o vento a leve, e disperse, e desfaça.
Que importa! Uma ilusão que nos alegra e afaga
há de ser sempre assim, no mar bravo da vida,
como a espuma que fulge e morre sobre a vaga.
Esta me há de fugir, esta que hoje me inflama!
E antes vê-la fugir como uma luz perdida
que possuí-la na mão como um pouco de lama...
[AMADEO AMARAL]
Pálida, à luz da
lâmpada sombria,
sobre o leito de
flores reclinada,
como a Lua por
noite embalsamada,
entre as nuvens do
amor ela dormia!
Era a virgem do
mar, na escuma fria
pela maré das
águas embalada!
Era um anjo entre
nuvens de alvorada,
que em sonhos se
banhava e se esquecia!
Era mais bela! o
seio palpitando...
Negros olhos as
pálpebras abrindo...
Formas nuas no
leito resvalando...
Não te rias de mim
meu anjo lindo!
Por
ti — as noites eu velei chorando,
por
ti — nos sonhos morrerei sorrindo!
Misael, funcionário da Fazenda, com 63 anos de idade,
Conheceu Maria Elvira na Lapa, – prostituída, com sífilis, dermite nos dedos, uma aliança empenhada e o dentes em petição de miséria.
Misael tirou Maria Elvira da vida, instalou-a num sobrado no Estácio, pagou médico, dentista, manicura… Dava tudo quanto ela queria.
Quando Maria Elvira se apanhou de boca bonita, arranjou logo um namorado.
Misael não queria escândalo. Podia dar uma surra, um tiro, uma facada. Não fez nada disso: mudou de casa.
Viveram três anos assim.
Toda vez que Maria Elvira arranjava namorado, Misael mudava de casa.
Os amantes moraram no Estácio, Rocha, Catete, Rua General Pedra, Olaria, Ramos, Bonsucesso, Vila Isabel, Rua Marquês de Sapucaí, Niterói, Encantado, Rua Clapp, outra vez no Estácio, Todos os Santos, Catumbi, Lavradio, Boca do Mato, Inválidos…
Por fim na Rua da Constituição, onde Misael, privado de sentidos e de
inteligência, matou-a com seis tiros, e a polícia foi encontrá-la caída em decúbito dorsal, vestida de organdi azul.
[ Manuel Bandeira ]
Eu vi a linda Estela e, namorado,
fiz logo eterno
voto de querê-la;
mas vi depois a
Nize, e a achei tão bela,
que merece
igualmente o meu cuidado.
A qual escolherei,
se neste estado
não posso
distinguir Nize de Estela?
Se Nize vier aqui, morr
o por ela;
se Estela agora
vier, fico abrasado.
Mas, ah! que
aquela me despreza amante,
pois sabe que
estou preso em outros braços,
e esta não me
quer, por inconstante.
Vem, Cupido,
soltar-me destes laços:
— faze de
dois semblantes um semblante,
ou divide o meu
peito em dois pedaços.
[ALVARENGA PEIXOTO]
Quando alguém pergunta a um autor o que este quis dizer, é porque um dos dois é burro.
[Mario Quintana]
Hão de chorar por
ela os cinamomos,
murchando as
flores ao tombar do dia.
Dos laranjais
hão-de cair os pomos,
lembrando-se
daquela que os colhia.
As estrelas
dirão: — "Ai! nada somos,
pois ela se morreu
silente e fria"...
E, pondo os olhos
nela como pomos,
hão-de chorar a
irmã que lhes sorria.
A Lua, que lhe foi
mãe carinhosa,
que a viu nascer e
amar, há-de envolvê-la
entre lírios e
pétalas de rosa.
Os meus sonhos de
amor serão defuntos...
E os arcanjos
dirão no azul, ao vê-la,
pensando em
mim: — "Por que não vieram juntos?"
[ALPHONSUS DE GUMARÃES]
Ó tu, que vens de
longe, ó tu, que vens cansada,
entra, e sob este
teto encontrarás carinho:
eu nunca fui
amado, e vivo tão sozinho,
vives sozinha
sempre, e nunca foste amada...
A neve anda a
branquear, lividamente, a estrada,
e a minha alcova
tem a tepidez de um ninho.
Entra, ao menos
até que as curvas do caminho
se banhem no
esplendor nascente da alvorada.
E amanhã, quando a
luz do sol dourar, radiosa,
essa estrada sem
fim, deserta, imensa e nua,
podes partir de
novo, ó nômade formosa!
Já não serei tão
só, nem irás tão sozinha:
há de ficar comigo
uma saudade tua,
hás de levar
contigo uma saudade minha...
[ALCEU WAMOSY]